introdução à leitura poética de mapa astral

JOGO DE ESCUTA E PRODUÇÃO DE SENTIDO

O mapa astral de uma pessoa é um desenho do céu do momento de seu nascimento. Naquele dia, naquela hora, esta era a configuração dos astros. No entanto, este é um mapa de uma pessoa viva, de uma vida que está em aberto; indeterminada, em constante movimento. Assim este mapa também está vivo, também está em fluxo.  

Não há uma leitura à priori, nem verdades a serem reveladas. Não há características determinadas ou tendências, nem qualidades e defeitos. A cartografia deste mapa só pode ser feita no encontro, a partir da escuta das questões que a pessoa traz, daquilo que a atravessa no momento. 

A leitura então é um jogo, uma desculpa, um pretexto para abrir esta escuta. O mapa é ponto de partida, não de chegada. Até posso contar as cartografias já feitas, movimento dos signos que já foram mapeados e observados. Mas e os movimentos inéditos que estão por surgir? E as forças singulares que ainda não encontraram passagem? Contar sobre o que já foi visto e mapeado só têm valor se puder produzir sentido para o que está se abrindo, naquele momento, para aquela pessoa.

A leitura é um exercício de produção de sentido. Partimos das imagens e desenhos desse mapa em busca de ressonâncias na experiência viva de cada pessoa. Nessa brincadeira imagética é como se pudéssemos chacoalhar esse mapa e fazer as imagens proliferarem, jogar uma pedra no lago do mapa e acompanhar as reverberações, ver até onde nos toca. 

Depois de falar de um signo ou de um planeta vem sempre a pergunta: que sentido isso faz pra você? Só faz sentido se fizer sentido. Se não abrir, se não ressoar, pode jogar fora ou então deixe cozinhar para que em outro momento estas imagens reapareçam. 

DESLOCAMENTOS, DIFERENTES PAISAGENS E PERSPECTIVAS

Muitos tempos nos atravessam, a astrologia é uma prática que escuta esses atravessamentos. Nesse jogo da leitura do mapa tentamos fazer um deslocamento. O eu-indivíduo não é mais o centro de referência, nem origem e fim de sua própria vida – com seus sucessos, culpas, méritos e fracassos pessoais. Esta vida singular é uma costura de forças temporais, este ‘eu’ é travessia. 

Há movimentos da vida que passam por nós, como os movimentos do Sol e da Lua no céu, as mudanças de estação e também cometas inesperados, explosões estelares. O grande exercício é se ver nesta passagem: nem estamos submetidos a um destino escrito previamente – forças exteriores agindo sobre nós, nem somos os donos egóicos do que acontece, traçando nosso caminho pela força da vontade, sem escuta do desconhecido. 

O carbono do nosso corpo pode ser o mesmo carbono produzido na primeira explosão do Universo, nascemos de um tempo cósmico e também de um tempo histórico, coletivo, político, geracional. Ao mesmo tempo, nós somos um evento inédito, sem reprise possível mesmo em bilhões e bilhões de anos. Como encontrar uma existência singular diante do tempo do cosmos? Como compor com os elementos que a vida nos dá? É possível uma ação receptiva? Um receber-criar?

Aqui não há a ideia de influência, nem de causa e efeito, não há um grande Lá-fora agindo sobre um pequeno aqui-dentro. O Lá-fora está aqui-dentro, somos também constelações e multiversos em nascimento. Os tempos são paralelos, fazemos parte do movimento da vida e assim somos tocados por forças que estão além da existência individual; originárias, anteriores e posteriores a cada pessoa.

POÉTICAS SINGULARES

Então fica a pergunta: como partir das histórias já contadas – das imagens, elementos, animais, cores, mitos e sonhos que aparecem no mapa astral – para contar novas histórias, literaturas e leituras sobre a vida singular? Nesta proliferação de imagens e contos, encontrar imagens próprias, contar e escrever sua própria história… 

Por isso uma astrologia poética: criar imagens a partir da escuta da vida que pulsa em nós, encontrar novas narrativas e dizeres para nossa passagem aqui. Sair das ‘profecias estelares’, da repetição do mesmo, para acompanhar e cartografar uma poética singular que pede passagem.

  • Julia Francisca, 2017
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